segunda-feira, 23 de abril de 2012

Singularização de um Antigo Plural

E foi assim...
Se fundindo, se confundindo, se fudendo...
Tanta fusão que confundiu, fundiu, fudeu!
Não há decantação que separe.
E não há processador de frutas multiuso que misture novamente.
É confuso, estranho, humano.

Não há antes, quiçá haverá um depois.
Ninguém sabe.
Ninguém sabe de nada.
De nada.
Obrigado.
De nada.

Foi obrigado pelas circunstâncias a mudar.
Verter-se para o seu lado mais obscuro, mais perverso, menos humano.
Desconheceu-se. E sentiu vergonha disso.
Matou-se pra se reinventar.
Levantou, tossiu, escarrou seus rancores, seus ódios
Sob lágrimas, apresentou seu peito aberto (que sangrava).
Não obteve respostas.
Estas nunca virão.

Que venha o que tiver de vir, não há forças, mas, morrer não assusta mais.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Ladainha da Paciência

Respiro, logo, não piro
Respiro, logo, não piro
Da pilha não me retiro
Não explodo porque respiro

Já Dizia Ary Toledo

Certas pessoas
Pessoas certas
Mesmas palavras
Ideias opostas
Enquanto umas te levam além
As outras te jogam na bosta.

domingo, 15 de abril de 2012

Sensação

As mãos...
Os dedos apertam-se, comprimem-se, torcem, retorcem, estalam, vão à boca, aos bolsos, à cabeça... Suam, tremem, coçam, param...

Os pés...
'Praláepracálejando', desequilibram-se, chutam, pulam, dão pequenos e ágeis tapas no chão, pisam, correm, caminham, param...

A boca...
Fala, rói, morde, cospe, saliva, os dentes batem, os lábios tremem, suspira, grita, sussurra, cala, soluça, pára...

O estômago...
Se 'nauseabundeia', enjôa, enoja, gela, gira, se retorce, faz borboletas amargas baterem asas, tem ânsias, pára...

A cabeça...
Gira, tonteia, descansa, bate, sua, apóia-se sobre as mãos, pensa, imagina, deteriora-se, balança, confirma, nega, pára...

O coração...
Dispara, pulsa, se aflige, sente, enfraquece, dói, desacelera, espera, pára...

Os olhos...
Que outrora miravam, quiçá olham...
Concentram-se em chorar...
Não, estes não param...

(Texto de Julho de 2008)

Fajuta Décima

Sei que não sou um grande poeta
Mas, não era mesmo o que eu queria ser
Só sou poeta, talvez pelo fato de sofrer
Ser poeta não é minha sina, nem tampouco meta
Não é tão difícil juntar palavras na ordem certa
Mais difícil é botá-las numa canção
Sendo pretencioso, querendo chegar ao coração
Eu nem sou cardiologista
Ser poeta é coisa pra mazoquista
Por isso me digo poeta fajuto, com meus escritos tão arroz com feijão.

(Texto de Outubro de 2008)

Odeio carnaval

Carro alegórico
Pierrot neurótico
Carro alegórico
Pierrot neurótico
Carro alegórico
Pierrot neurótico
Neurose alegórica
Alegoria neurótica
Pierrot de carro
Bebeu e dirigiu, 

Puta que o pariu!
Que se dane
Odeio carnaval!
Chora agora, Colombina!

Fim de Tarde

Sinto o sabor amarelo-alaranjado de um fim de tarde, me vem aos ouvidos aquele cheiro de saudade e cada nota musical tem o perfume daquele dia que te vi pela última vez.
E todo fim de tarde é igual.
Eu me sento na beira do mar e espero um vento te trazer e uma onda te ancorar e você não vem, nunca mais... Fico sem porto, sem barco, sem vela, sem cais...
Caminho pela areia, que enche minhas sandálias... Procuro uma sereia, pra não me deixar morrer na praia de tanto esperar.
"Me leva, me leva, sereia
Faz teu canto me encantar
Me faz esquecer
Me deixa dormir
Pra poder me matar..."
Nem sequer há estrelas no céu, tampouco no mar... Nem um vagalume vadio com um ponto de luz pra me iluminar.
Só o sabor amarelo-alaranjado transformando meu paladar num palco de fel, por onde as palavras não passam e assim nunca posso cantar, pra espantar a tristeza e esperar a morte chegar.
Sinto uma abstinência de mim mesmo... Nem eu mesmo estou 'inda ali pra me ajudar.
Já saí de mim, não sou nem algo, nem alguém. Sonho com algo que fui, sonho com algo que foi, sonho com alguém que se foi...
E vou me despedaçando aos poucos, deixando o coração bater até o último segundo, quando tocar o chão ao pé da roseira onde escolhi pra morrer.
Rabisco palavras desconexas no chão, com uma pedra e minhas últimas forças se calam.
Não encontrei a quem perdi e nem nunca vou encontrar, esperei em vão... num vão, no vão da vida descobri que o sentido da vida é viver... óbvio demais, mas um segredo pra poucos, pérolas para porcos... e ali, morri.
Ressurgi ao terceiro dia e subi ao céu, agora eu era carcaça presa no pés da ave. Não sentia nada, só o sabor amarelo-alaranjado, com o cheiro da saudade que eu sentia de você.
Naquele dia te vi voltar, me procurou incessantemente. Não me encontrou.
E todo fim de tarde se tornou diferente do que fora, mas sempre... igual...

(Texto de Janeiro de 2009)

O Homem Longínquo

O homem longínquo que bate seus dedos em duras teclas de sua alma de poeta, faz gotejar pequenos versos na tela e deles cria um quase sorriso em sua dura face.
Mastiga um pedaço de pão amanhecido. Molha-o com vinho barato e o faz descer pela garganta, que há muito não faz nascer nenhuma palavra sonora. Suas palavras transcendem as palavras comuns.
Palavras da alma? Palavras de calma?
Não sei que palavras são essas, não entendo, mas sei que necessito delas...
Aliás, que maldito homem é esse, que nada fala e muito diz?
Será essa sua receita pra ser feliz?
Sua tristeza e sua solidão ele mata a cada minuto recluso em sua fábrica de poemas. Longe das mazelas, longe dos problemas. Cria suas mazelas e seus próprios problemas nos fundos, no quintal, e quando, gordos, assa-os e serve-se.
E lá, bem longe, no alto da serra, dorme o homem longínquo.
Amanhã é dia de fazer poesia. A poesia do mundo...
E o mundo não pode esperar.
Enquanto existe poesia, existe esperança, existem domingos de sol com barulhos de risos de crianças.
E quando morrer ao longe o longínquo homem?
O que será de nós?
Virá um Zaratustra nos trazer uma novidade?
Virá algum alguém pra nos contar a verdade?
Silêncio...
Dorme aqui o homem longínquo...
(Texto de Janeiro de 2009)