terça-feira, 7 de março de 2023

Descansemos em Paz

Hoje eu acordei com uma sensação estranha. O peito doía. O ar parecia estar denso, rarefazendo-se. Respirei fundo e ouvi um grito mudo. Meu? Seu? Não sei.
Resolvi abrir o peito, mesmo sob as insistentes lágrimas que ousavam brotar. Abri e vi que você havia se matado lá dentro, aqui dentro. Hoje foi o dia em que você morreu dentro de mim, dentro do meu peito, dentro do meu eu, dentro do meu amor. Fiz uma prece. Sem pressa.
Comprei flores, trouxe até bem perto da fenda aberta. Senti seu cheiro. Senti o cheiro da lembrança de quando você vivia em mim. Quis chorar, mas sorri com ternura.
Levei tudo o que havia restado de você em mim para a beira d'água. Decidi ritualizar de outra forma essa passagem. Não vou te enterrar em mim. Não merecemos conviver com essa dor, com a putrefação dos sentires.
Lavei tudo com cuidado, com a mesma devoção amorosa de outrora. Sorri com saudade.
Estamos livres definitivamente agora. Que descansemos em paz.
(Edson Teles)